Reforma da Previdência deve ser dividida em três grupos

Mudanças não afetariam trabalhadores prestes a se aposentar

POR GERALDA DOCA / MARTHA BECK, O GLOBO 17/07/2016 4:30 / atualizado 17/07/2016 11:01

BRASÍLIA – A reforma da Previdência Social será costurada de modo que seus impactos sejam diferentes para os brasileiros de acordo com sua situação no mercado de trabalho. Em sua primeira entrevista desde que assumiu o cargo, o secretário de Previdência Social, Marcelo Caetano, afirmou ao GLOBO que a tendência do governo é definir três grupos na elaboração da proposta. Os mais jovens — que vão ingressar no mercado ou entraram há pouco tempo —, para os quais as mudanças serão mais duras; os trabalhadores que estão numa fase intermediária, com dez ou 20 anos de serviço, que terão de seguir regras de transição; e as pessoas que já completaram os requisitos mínimos para se aposentar ou que vão atingir essas condições até a aprovação da reforma, que não serão atingidas.

Marcelo Caetano diz que tempo de transição é a parte mais difícil - Jorge William

Marcelo Caetano diz que tempo de transição é a parte mais difícil – Jorge William

Reforma. Marcelo Caetano diz que tempo de transição é a parte mais difícil – Jorge William / Jorge William/13-7-2016

Segundo Caetano, a modulação dessas regras é a parte mais difícil da reforma. Ele explicou que, num cenário em que as mudanças valham apenas para as novas gerações, o impacto sobre as contas públicas somente será sentido a partir de 2040. E a redução dos gastos previdenciários seria pouco expressiva, da ordem de 0,1% a 0,2% do Produto Interno Bruto (PIB), apenas a partir daquela década.

Caso as novas regras valessem para todos, sem as de transição, seria possível projetar matematicamente que, em menos de uma década, haveria uma redução de gastos da ordem de cerca de 1% do PIB. Mas, segundo Caetano, uma mudança imediata e radical é improvável:

— O critério de corte para as regras de transição e para as regras permanentes ainda não está definido. O tempo da transição é a parte mais difícil da reforma.

O secretário afirmou que há várias regras de transição sobre a mesa do governo. Uma delas é seguir a sistemática do pedágio, já usada na reforma de 1999, em que se calculava quanto tempo o trabalhador ainda tinha para se aposentar e se colocava um período adicional de contribuição. Também é possível fixar a norma com base no tempo de contribuição, na idade ou na data em que o trabalhador começou a contribuir para o regime. Outra ideia é combinar essas três variáveis.

IDADE MÍNIMA

Caetano destacou que, se nada for feito, o sistema, já deficitário, poderá ficar inviável na virada para 2030, diante do envelhecimento rápido da população. Segundo ele, sem os ajustes que permitam corrigir a trajetória de crescimentos das despesas com benefícios, só existirão dois caminhos para cobrir o rombo nas contas previdenciárias: aumentar impostos ou sacrificar mais investimentos em outras áreas.

O secretário disse ainda que o governo discute uma forma de postergar o pedido da aposentadoria — o que ocorre hoje aos 50 anos de idade, em média. Isso ocorre porque as pessoas podem se aposentar apenas por tempo de contribuição, de 35 anos (homens) e 30 anos (mulheres) — sem exigência de idade mínima. De acordo com ele, apenas 12 países permitem esse tipo de aposentadoria. Na América Latina, só o Equador, e mesmo assim, são 40 anos de tempo tanto para homens quanto para mulheres.

— Há pessoas que se aposentam na faixa dos 50 anos. Com isso, o tempo de recebimento do benefício pode ficar bastante longo, e você ter dificuldades de sustentar, de financiar o pagamento. Conseguir prorrogar a data da aposentadoria é algo que realmente se discute.

Caetano disse estar otimista com o andamento da reforma. Ela foi prometida pelo presidente interino, Michel Temer, para as primeiras semanas de governo, mas agora não há definição sobre quando será apresentada. O mais provável é que isso só ocorra depois da votação definitiva do impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff. Segundo o secretário, as mudanças na Previdência “estão caminhando”, mas o momento de sua apresentação caberá à área política do governo.

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— Depende de uma decisão política. A questão é identificar exatamente quais são os pontos que serão ajustados. Você tem de ouvir a sociedade antes. Não dá para colocar uma reforma sem passar por um processo de diálogo. Há um processo de negociação que está se desenvolvendo na Casa Civil e não é só com as centrais. Você tem representações patronais e vários outros grupos — disse Caetano.

BENEFÍCIOS ASSISTENCIAIS

Até lá, o governo continuará atuando para reduzir outros gastos. Estão agora na mira os benefícios assistenciais como a Lei Orgânica de Assistência Social (Loas). Ela garante o pagamento de um salário mínimo a pessoas idosas ou deficientes de qualquer idade que comprovem não possuir meios de se sustentar ou serem sustentados por suas famílias. Suscetível a fraudes e alvo de disputas judiciais, o programa teve um crescimento vertiginoso em seus gastos entre 2002 e 2015. Nesse período, eles saltaram de R$ 7,5 bilhões para R$ 39,6 bilhões. Já o número de beneficiários mais do que duplicou, passando de 1,6 milhão para 4,2 milhões de pessoas. Segundo Caetano, a ideia agora é criar um diferencial entre quem contribui para a Previdência e quem apenas recebe um benefício sem fazer qualquer aporte:

— Temos que ver uma consistência do benefício assistencial com o previdenciário. As pessoas que contribuíram e pagaram mais teriam um tratamento diferenciado em relação a outras que não tiveram um histórico contributivo — disse Caetano.

 

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