O pensamento do ministro Rossetto sobre a reforma da Previdencia

Ano XVIII, Edição nº 1.454 – Brasília, 18 de Fevereiro de 2016

O pensamento do ministro Rossetto sobre a reforma da Previdencia.
Desvincular mínimo da Previdência não está em pauta, diz Rossetto

VALOR ECONÔMICO – SP , Edna Simão e Ribamar Oliveira | De Brasília, 15.02.2016

Apesar das resistências de seu próprio partido, o PT, e das centrais sindicais, o ministro do Trabalho e Previdência Social, Miguel Rossetto, aposta no diálogo para alcançar “pontos de convergências” que permitam a reforma da Previdência Social, a partir do Fórum criado para discutir o assunto e que se reúne nesta quarta-feira. A expectativa de Rossetto é que governo consiga chegar a uma proposta com os diversos interlocutores até o fim deste semestre.

Em entrevista ao Valor, Rossetto deixou claro que a desvinculação dos benefícios previdenciários do reajuste do salário mínimo não estará na mesa de negociação. Para o ministro, “preservar o salário mínimo como piso previdenciário é uma das referências estratégicas da reforma”. Ele lembrou que a política de reajuste do salário mínimo “está resolvida” até 2019. Vários especialistas consideram que a repercussão do aumento real do mínimo sobre os benefícios previdenciários é uma das principais razões do desequilíbrio do sistema.

Rossetto ressaltou que não há uma posição “concluída” no governo com relação à fixação de idade mínima para requerer aposentadoria. O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, defende uma idade mínima de 65 anos. Essa é, segundo Rossetto, uma opinião de Barbosa, entre várias outras que existem no governo.

Mas tudo, conforme o ministro, está em discussão, como a equiparação das regras de concessão de aposentadoria para homens e mulheres, assim como as dos trabalhadores da iniciativa privada e servidores públicos e dos trabalhadores da área urbana e da rural. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Valor: No atual quadro político, de grandes dificuldades do governo no Congresso, o senhor acha possível avançar em uma reforma da Previdência Social?

Miguel Rossetto: Seguramente em alguns pontos. Este é um tema relevante para o governo. A presidente Dilma Rousseff tem sinalizado claramente a importância deste debate, que transcende o interesse de governo de curto prazo. Nós temos que entender que esta (a questão previdenciária) é uma agenda permanente e tem sido tratada assim pelo Congresso Nacional ao longo dos anos.

Valor: Mas as resistências são grandes?

Rossetto: Penso que o país tem maturidade, como tem demonstrado ao longo de todos esses anos, para enfrentar esse tema preservando duas referências estratégicas. A primeira delas é preservar um modelo de previdência solidário, de repartição simples, de caráter contributivo e com contribuição de impostos, que é uma experiência positiva para o país. A segunda é a preservação do salário mínimo como piso previdenciário importante. A manutenção do poder de compra dos benefícios previdenciários, de um modelo solidário de previdência, de repartição simples, que é o regime geral, que ao lado do regime próprio dos servidores, se constituíram nesse grande patrimônio de seguridade para os brasileiros. O regime geral concede 28 milhões de benefícios previdenciários anuais e possui 51 milhões de contribuintes. Por isso, a reforma é um tema a ser tratado com serenidade, com responsabilidade e com sobriedade.

Valor: Vários líderes importantes do PT já se manifestaram contrários à reforma da Previdência, assim com líderes da base aliada. Como avançar na reforma em ano de eleição municipal? A posição do PT não é um obstáculo à reforma?

Rossetto: O partido tem debatido e vai debater este tema. Como todos os partidos da base aliada e o Congresso Nacional. Nós estamos abrindo esta agenda. É evidente que, para nós, o resultado dessa agenda não pode se traduzir unicamente em mais conflito. Esta tem que ser uma agenda de convencimento, de informação sobre o sistema. Eu acredito na nossa capacidade de construção de acordos importantes. Vamos construir uma agenda ampla, de diálogo, que significa escutar. Tenho absoluta confiança, segurança, que as centrais sindicais, o setor empresarial, os partidos políticos têm muito a contribuir e vão oferecer sugestões em cima de um roteiro básico para assegurar aquilo que é uma referência para o governo: preservar uma Previdência solidária, justa para todos.

Valor: No passado, as mudanças na Previdência eram feitas sempre no início do mandato do presidente, com um governo forte, algo muito diferente do que vivemos hoje. Ainda não sabemos se vai haver ou não impeachment. Qual é a estratégia do governo para conseguir esse convencimento em torno das mudanças da Previdência?

Rossetto: Do ponto de vista político, é correto o tema que vocês trazem. Por isso a importância do diálogo, do convencimento, da convocação para que todos esses atores e essas representações políticas participem dessa agenda, manifestem sua opinião sobre essa agenda. Exatamente por conta dessa situação delicada, sensível, é que nós temos que trabalhar em um ambiente de convencimento.

Valor: Mas o governo não tem esse ambiente de convencimento hoje.

Rossetto: É por isso que vamos trabalhar de uma forma dedicada, com números, com dados, com atualização da estrutura previdenciária, das condições demográficas do país, estimular de uma forma forte esse ambiente que é de responsabilidade comum. Teremos pontos de consenso? Provavelmente. Teremos também pontos de conflito. Nós não pretendemos que essa agenda seja uma agenda só de conflito. É uma agenda difícil, mas achamos que, neste ambiente de construção de responsabilidades comuns, poderemos encontrar pontos de concordância. Vamos avaliar, ao final desse processo, as iniciativas que tomaremos. Alguns dizem que a melhor das reformas é aquela que pode ser feita. Talvez seja importante nós avançarmos naquilo que é estratégico para o nosso país, preservando direitos constituídos. Vamos trabalhar com grande sensibilidade os mecanismos de transição, assegurando uma estabilidade clara e compreensível a toda sociedade dos períodos de transição, a exemplo de outros países. Todas as eventuais mudanças e aperfeiçoamentos serão feitos para preservar o modelo de previdência solidária e justa.

“A preservação do salário mínimo como piso previdenciário importante é uma referência estratégica”

Valor: A expectativa, que surgiu devido a declarações do ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, era de que o governo apresentasse na próxima reunião do Fórum uma proposta de reforma. Mas o senhor disse que será definido apenas um cronograma de discussão. O governo colocou um pé no freio?

Rossetto: Não fui eu que definiu isso. Foi uma agenda acordada no Fórum. As centrais sindicais e o setor empresarial discutiram uma agenda de crescimento para o país, que foi enviada à presidente Dilma. Foi definido também que o governo retornaria ao Fórum, com uma resposta a essa agenda. Esse é o tema que nós vamos tratar no dia 17. Isso é público. Ao mesmo tempo, nós acordamos com as centrais sindicais que debateríamos um cronograma de trabalho para discutirmos uma agenda da Previdência em dois pontos fundamentais: um diagnóstico e cenários. Nós pretendemos preparar esse calendário, que será amplo, aberto, e acordar uma metodologia.

Valor: Com prazo?

Rossetto: Com prazo. Este é um debate que terá começo, meio e fim. A nossa referência é o primeiro semestre.

Valor: Concluir o debate no primeiro semestre?

Rossetto: Exatamente. Vamos trabalhar para estabelecer uma agenda clara sobre todos os temas que vão perpassar essa atualização: os financiamentos, a sonegação, as fraudes, os benefícios, a idade mínima, o tempo de contribuição, a convergência entre o regime público e o regime privado, a convergência entre homens e mulheres, entre rurais e urbanos, as renúncias previdenciárias. O Brasil fez movimentos contraditórios ao longo dos últimos anos. Nós ampliamos a cobertura previdenciária, mas retiramos receitas e ampliamos renúncias previdenciárias.

Valor: Esse é o roteiro básico a que o senhor se referiu?

Rossetto: Sim. Vamos buscar convergências na perspectiva de preservar, com sustentabilidade, o modelo previdenciário brasileiro, diante das grandes transformações demográficas que estão acontecendo na sociedade brasileira, que são bem-vindas.

Valor: Quais são as mudanças?

Rossetto: O Brasil acelera duas transformações bem-vindas. A população de idosos cresce. Em 2015, as pessoas com mais de 60 anos correspondiam a 10% da população e em 2030 chegarão a 20%, com crescimento progressivo. Hoje, o cidadão brasileiro com 60 anos vive, em média, mais 22 anos e meio. Temos, portanto, uma maior participação de idosos na população e idosos que vivem mais. Ao mesmo tempo, temos uma segunda reforma demográfica, que é a redução da taxa de fecundidade. Hoje, a taxa de fecundidade é 1,74. Com isso, teremos uma alteração naquilo que chamamos de razão de dependência entre quem trabalha e quem já trabalhou e deve ter a sua aposentadoria. Essa alteração implica uma avaliação e aperfeiçoamentos. Porque a base de um sistema solidário e de repartição simples, como é o nosso, quem trabalha financia quem já trabalhou. Essas contribuições previdenciárias são complementadas por recursos de impostos, no nosso caso especialmente pela Cofins e pela CSLL. É esse equilíbrio que vamos avaliar. O equilíbrio entre as contribuições previdenciárias e os recursos dos impostos que deverão financiar, com estabilidade, esse novo perfil previdenciário que já começamos a viver e vamos viver.

Valor: Qual é a sua posição sobre a idade mínima para requerer aposentadoria?

Rossetto: Nós vamos construir isso. Todos esses temas estão sendo avaliados pelo governo. O governo não tem uma posição concluída sobre esse tema.

Valor: Então, quando o ministro da Fazenda defende uma idade mínima de 65 anos, ele não está falando pelo governo?

Rossetto: Existem várias opiniões dentro do governo. A opinião do ministro da Fazenda é uma delas. Todas estão sendo debatidas com responsabilidade, com rigor, de forma a responder a essa agenda, a essa proposta de reforma da Previdência feita pela presidente Dilma.

Valor: O senhor é contra a reforma da Previdência?

Rossetto: Não. Sou a favor de um modelo previdenciário solidário, como o modelo brasileiro, com sustentabilidade. Um modelo que deve ser permanentemente aperfeiçoado, preservando direitos e com sustentabilidade financeira. Sou a favor dessa grande conquista da sociedade brasileira construída a partir da Constituição de 88, que mudou nosso país.

Valor: Existe uma forte resistência das centrais sindicais ao estabelecimento de uma idade mínima. Elas preferem a manutenção da fórmula 85/95.

Rossetto: Vamos dialogar com as centrais e com os parlamentares. Debater sobre nossas experiências do tempo de contribuição e da idade mínima previstas na Constituição. Também vamos avaliar aquilo que foi aprovado no ano passado, que é a fórmula 85/95, que combina o tempo de contribuição e idade.

Valor: O governo pretende igualar a idade e o tempo de contribuição entre homens e mulheres. Qual sua opinião?

Rossetto: Precisamos verificar se as razões para se ter essas diferenças se justificam nos dias de hoje. Uma das razões era a maternidade. Muitas mulheres saem do mercado de trabalho porque a sociedade imputa às mulheres um trabalho de responsabilidade dos filhos. Nós vamos avaliar essas condições.

Valor: Qual a experiência internacional?

Rossetto: Ela caminha no sentido da convergência. A experiência internacional fará parte da reflexão que vamos fazer.

Valor: A igualdade de gênero, então, está na agenda?

Rossetto: A avaliação de condições diferenciadas para aposentadoria de homens e mulheres fará parte do debate. Do mesmo jeito que fará parte desta agenda a diferenciação entre trabalhadores rurais e urbanos.

Valor: Mas é possível equiparar as regras da previdência dos trabalhadores rurais com os da área urbana?

Rossetto: Tudo isso vamos avaliar. São condições de trabalho diferente. Temos que entender. A base dessa estrutura foi definida em 1988.

Valor: As empresas exportadoras de produtos agropecuários são isentas de contribuição previdenciária de 2,5%. Isso não é contraditório com um regime sustentável?

Rossetto: É um tema em avaliação.

Valor: A desoneração da folha de pagamentos também isentou (da contribuição previdenciária) as empresas exportadoras que optaram pela nova contribuição sobre o faturamento.

Rossetto: Esse desequilíbrio começou a ser corrigido a partir do ano passado. Nós temos que corrigir desequilíbrios. Por isso, o tema do financiamento da Previdência fará parte da agenda.

“A ideia é colocar [a CPMF] para a seguridade social, por conta dos temas que envolvem os Estados e municípios”

Valor: Tanto o governo dos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva caminharam na direção de igualar as regras de aposentadoria dos servidores públicos com as do INSS. Essa ideia prevalece?

Rossetto: A ideia é buscar convergência de tal forma que todos os brasileiros participem de um sistema previdenciário com regras comuns e que seja um sistema justo, adequado.

Valor: As regras que pretendem estabelecer valerão a partir de quando e para quem?

Rossetto: Todos aqueles que têm direitos constituídos nas regras atuais terão assegurados seus direitos. Não só os aposentados como os que já têm condições de aposentadoria. Os direitos adquiridos estão assegurados. Portanto, não há necessidade de nenhuma corrida, de antecipação de aposentadoria por conta disso. Haverá um período de transições frente a eventuais mudanças. Não vai ter truque. Não haverá surpresa.

Valor: Se ao final do semestre, o governo não chegar a uma proposta única o que acontece? Não será apresentada uma proposta?

Rossetto: Nós vamos avaliar a nossa posição a partir do debate. Um debate para valer depende de convencimento, argumentos. É um debate para valer. Nós estamos convencidos e vamos trabalhar para constituição de pontos de convergência.

Valor: A presidente Dilma tem dito que a reforma da Previdência não tem impacto no curto prazo e que está pensando no futuro do país. Mas neste ano o déficit da Previdência Social vai ultrapassar os R$ 100 bilhões. O que fazer no curto prazo?

Rossetto: Temos uma agenda de trabalho em vários níveis. Por exemplo, uma agenda administrativa, que busca melhoria de gestão e da eficiência, combate à fraude e sonegação. Temos agenda de mudanças normativas. Quando falamos de 2015, o déficit [R$ 85,818 bilhões] foi provocado pela queda da receita previdenciária por conta da redução da massa salarial e da atividade econômica. Foram 1,5 milhão de postos de trabalho, infelizmente, eliminados. As despesas não estão descontroladas na Previdência. Ao longo dos últimos anos, preservamos uma necessidade de financiamento em torno de 1% do PIB. Recuperar no curto prazo é uma combinação basicamente de recuperação do crescimento econômico.

Valor: Mas não há perspectiva, no curto prazo, de retomada da economia para ajudar a amenizar o déficit previdenciário..

Rossetto: Estamos em um cenário econômico instável. São dificuldades relacionadas a questões internacionais que se somam às nossas dificuldades internas. Todos os países estão concentrados em suas agendas econômicas e de superação de um período global difícil. Qual é minha expectativa para 2016? Que neste ano possamos nos concentrar em agendas estratégicas para o país e que essa irresponsabilidade de impeachment, que retirou grande parte da energia política de 2015, seja definitivamente enterrada.

Valor: O governo também depende da aprovação da CPMF?

Rossetto: A recuperação da atividade econômica é a prioridade orientada pela presidente Dilma Rousseff, geração de emprego e massa salarial. No curto prazo é fundamental a aprovação da CPMF. Temos muita confiança que ela será aprovada, pois é muito importante para o país.

Valor: Estão querendo destinar a CPMF para a saúde?

Rossetto: A ideia em debate é colocar para a seguridade social, por conta dos temas que envolvem os Estados e municípios.

Valor: Vai ser preciso mudar a proposta de emenda constitucional encaminhada pelo governo, que prevê que os recursos da CPMF serão destinados à cobertura do déficit da Previdência.

Rossetto: Isso. A CPMF é destinada à Previdência e o debate no Congresso, junto aos governadores e prefeitos, orienta para uma despesa daseguridade social.

Valor: O senhor é contra desvincular os benefícios previdenciários do reajuste do salário mínimo?

Rossetto: Sim. Esse é um tema resolvido até 2019. O Congresso aprovou recentemente, por iniciativa da presidente Dilma, a politica de valorização do salário mínimo até 2019.

Valor: O tema de desvinculação do salário mínimo dos benefícios previdenciários não está na agenda da reforma?

Rossetto: Não.

Sem acordo sobre Previdência

CORREIO BRAZILIENSE – DF  , CÉLIA PERRONE, 16.02.2016

Divergências dentro do governo e resistência de políticos da base aliada emperram a reforma do sistema previdenciário, considerada fundamental para reorganizar as contas públicas. Fórum criado com o propósito de discutir o tema se reúne amanhã

O governo terá dificuldade de levar adiante a proposta de reforma da Previdência, apesar do alerta de especialistas de que a medida é fundamental para colocar as finanças públicas em ordem e garantir a sustentação do regime de aposentadorias no futuro. Embora tenha prometido avançar na discussão de regras que impeçam o colapso do sistema, a presidente Dilma Rousseff não demonstra convicção sobre a necessidade das mudanças. Além disso, enfrenta resistências na base aliada  – que se recusa a encarar a reforma, devido à impopularidade do assunto – e dentro do próprio Executivo.

Amanhã haverá nova reunião do Fórum da Previdência, criado no ano passado pelo governo, com a participação de empresários, estudiosos do tema e sindicalistas, para discutir propostas de alteração no sistema previdenciário. Mas, enquanto o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, diz que vai apresentar um projeto, o titular da Previdência, Miguel Rosseto, que preside o Fórum, afirma que o encontro será apenas para definir um cronograma de discussão. Entre as propostas defendidas pela área econômica estariam o estabelecimento de 65 anos como idade mínima para que tanto homens quanto mulheres possam requerer a aposentadoria. Outra medida seria a desvinculação dos benefícios do salário mínimo.

Desorganização

“Quando o ministro da Previdência diz que a opinião do colega da Fazenda é apenas mais uma palavra no debate, é sinal de que o grau de desorganização no governo chegou ao máximo. Será uma enorme perda de tempo se não houver uma proposta concreta na mesa”, avaliou Fabio Giambiagi, especialista em finanças públicas e previdência social.

“O problema é que colocaram a raposa para tomar conta do galinheiro. Quando se nomeia um sindicalista para cuidar de uma matéria que exige um especialista, é difícil chegar a um acordo”, afirmou Renato Follador, consultor que há mais de 30 anos atua na área de Previdência. Para ele, quanto mais demorarem as reformas, mais o país e os próprios aposentados pagarão por esse atraso. “A alternativa para viabilizar o sistema seria criar impostos, coisa que a sociedade não suporta mais, ou aumentar a contribuição, o que seria inviável também, dado que o empregador já paga 20% e o trabalhador, mais 11,5% do salário”, ressaltou.

Follador diz que é importante regulamentar a idade mínima e a igualdade de gênero na concessão do benefício, a exemplo do que acontece em outros países. Também é a favor da desvinculação do salário mínimo das aposentadorias por causa do impacto que provoca nas contas públicas. “Salário mínimo regula mercado de trabalho. As aposentadorias deveriam ser apenas corrigidas pela inflação”, frisou.

Ambos os especialistas acreditam que, sem consenso sobre a necessidade da reforma, a tendência é que ela seja empurrada com a barriga até que o custo de protelar as mudanças seja superior ao de enfrentar o problema. “A Previdência vai quebrar o Brasil. A reforma fica dividida entre direito adquirido e expectativa de direito. Quanto mais longo o período de transição, melhor para o segurado, mas pior para o país”, definiu Follador.

Desigualdade

O professor Rodolfo Hoffmann, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), afirma que o sistema previdenciário, sobretudo quando se consideram as aposentadorias do setor público, reforça a desigualdade de renda no Brasil. “Não é uma questão de idade ou de gênero que vai resolver. Tudo ajuda, é claro, mas a maior parte dos rendimentos da previdência são elevados e distribuídos de maneira injusta.” Ele afirma que os 2% brasileiros mais ricos recebem o mesmo valor, na forma de aposentadorias e pensões, que os 60% mais pobres.

Para economistas, discursos divergentes põem reforma da Previdência em dúvida

Camilla Veras Mota e Arícia Martins | VALOR ECONÔMICO – SP ,16.02.2016   

Os dissensos entre os ministérios do Trabalho e da Fazenda em relação à reforma da Previdência são um começo ruim de um debate que deve ser difícil e que promete uma eventual tramitação conturbada caso siga para o Legislativo, avaliam economistas. Para muitos deles, a falta de unidade no discurso do governo levanta dúvidas sobre sua real disposição em levar a cabo uma reforma sabidamente com elevado ônus político.

Em entrevista publicada ontem no Valor, o ministro do Trabalho, Miguel Rossetto, afirmou que o governo não tem posição fechada, entre outros temas, sobre a elevação da idade mínima para a aposentadoria – para muitos especialistas, o ajuste mais urgente. Rossetto classificou como opinião pessoal de Nelson Barbosa as declarações do ministro da Fazenda em defesa da instituição da uma idade mínima de 65 anos.

“A discussão sobre a reforma começa muito mal. Não sabemos quem está falando pelo partido e quem está falando pelo governo. O Barbosa não tem ´opinião pessoal´, sua opinião é a de ministro”, ressalta o professor da FEA-USP Luís Eduardo Afonso. O especialista em Previdência lembra que reformas desse tipo geralmente são feitas em início de governo, aproveitando o capital político pós-eleições.

O debate atual, pondera, é mais um desdobramento do problema fiscal, que torna premente a redução de gastos. “A impressão é que vão sair apenas pequenos remendos, como a cobrança da contribuição dos exportadores agrícolas”, diz, em referência à proposta de fim da isenção de 2,6% a produtores que vendem ao exterior.

“O ministro Rossetto sempre foi publicamente contra. Se o governo realmente queria fazer reforma, por que o nomeou para o ministério?”, questiona José Márcio Camargo, economista da Opus Gestão de Recursos e professor da PUC-Rio. “Minha avaliação é que o governo não quer fazer reforma da Previdência. Está tentando jogar para a plateia e ganhar tempo.”

“A reforma já seria difícil de aprovar no Congresso, dada a fragilidade política e a impopularidade do governo – sem falar na pressão pelo impeachment -, mas, na prática, vai ser difícil até mesmo sair uma proposta do governo, em função da falta de consenso”, afirma Rogério Nagamine Costanzi, técnico do Ipea e ex-funcionário do Ministério do Trabalho.

Para ele, a resistência à desvinculação dos pisos previdenciários ao salário mínimo, ressaltada por Rossetto, era esperada. Além de exigir emenda constitucional, o tema sempre foi rechaçado no PT. Mantida a vinculação, diz, seria necessário rever a política de valorização do mínimo, fixada até 2019 e insustentável a médio prazo.

O economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, avalia que a desvinculação deveria ser uma das primeiras medidas, em paralelo a uma revisão da própria fórmula de reajuste do mínimo. “Não há razão para acreditar que a presidente esteja realmente empenhada nisso, depois de cinco anos ignorando o problema e, na verdade, piorando a situação. Agora que não há força política nem para aprovar uma medida que depende de voto majoritário apenas, o que dirá medidas mais duras como idade mínima”.

Para o economista-chefe do banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, as diferenças entre Trabalho e Fazenda são compreensíveis: os ministérios têm agenda própria. Para ele, é positiva a busca de consenso via Fórum de Debates sobre Políticas de Emprego, Trabalho e Renda e de Previdência Social, que se reúne amanhã.

Afonso questiona a iniciativa, lembrando o desfecho do fórum instituído com igual propósito em 2007, encerrado com documentos “vagos” e sem proposta concreta.

Ainda que não acredite em um avanço prático, Mauro Schneider, economista da MCM Consultores , enxerga como positiva a retomada da discussão, especialmente se ela for séria. Para ele, a reestruturação da Previdência é parte de uma necessidade maior de revisão de uma série de instituições públicas, que diminua a rigidez dos gastos, que simplifique e torne mais eficiente a arrecadação tributária e que equalize as distorções causadas pelas concessões de subsídios e benefícios a determinados setores.

Previdência Social