Levar os segurados do INSS para fazer perícia no SUS não é solução, é um agravo.

Por Paulo César Regis de Souza (*)

No mundo e no Brasil, a regra geral dos sistemas de previdência social paga a impossibilidade de trabalhar segundo determinadas condições e critérios somente por incapacidade e não por doença. Exemplo: hipertensão arterial e o diabetes são doenças, mas necessariamente não geram incapacidade.

A perícia médica na Previdência data de 1919.  Portanto, há mais de 90 anos.

A perícia nasceu associada ao Seguro de Acidente do Trabalho

Antecede a Lei Eloi Chaves, de 1923, que explicitou a necessidade da avaliação médico pericial para fins de concessão de benefício por incapacidade.

Nas caixas e nos institutos, a perícia sempre existiu, foram estruturados com vista a avaliação da incapacidade.

Com o INPS, em 1967, foi estruturada de forma organizacional e profissional. O Manual do Médico Perito da Previdência condensou as bases legais, quadros, ambiente, normas e procedimentos indispensáveis aos peritos.

Em 1998, foram criados protocolos para nortear a avalição, considerando lesões de esforços repetitivos, perda auditiva induzida por ruído, doenças pulmonares, seguidos pelos de clínica médica, psiquiatria, ortopedia. Esses protocolos padronizaram a análise e a decisão dos peritos, baseados em evidências e na melhor prática médica. Os peritos têm que ter base clinica sólida, conhecer o gesto profissional relacionado com o trabalho e estar em dia com a base legal para concluir dentro da legislação, sob pena de transgressão disciplinar.

Ainda em 1998, se fez o 1º concurso para supervisor médico pericial. O perito e o supervisor têm carga horária de 40 horas semanais, com funções distintas. O perito na perícia (na ponta) e o supervisor na gestão do processo. Em 2004, houve novo concurso para a carreira médico perito da Previdência

No início da década de 2000, a Perícia não tinha quadros para responder ao crescimento da demanda por benefício por incapacidade (os benefícios da LOAS já estavam na Perícia) e o governo decidiu terceirizar a concessão por pressão política. Houve uma explosão de concessão de auxílios doença. Os benefícios por incapacidade são os mais frequentes, mais complexos. A luz vermelha foi acesa, realizou-se um novo concurso de peritos e foi dada exclusividade da avaliação aos peritos, cessando a terceirização. Os prejuízos no caixa da Previdência foram vultosos pois de cada 100 benefícios requeridos, 60 são de auxilio doença e aposentadoria por incapacidade.

Os concursos de 1998 e 2004 resultaram das pressões e ocorrências registradas na concessão dos benefícios de prestação continuada instituídos pela Lei Orgânica da Assistência Social-LOAS, cuja análise e concessão dos benefícios para deficiente foi imposta ao INSS (sem ônus para o Tesouro). Até então eram feitas por qualquer médico municipal, estadual, federal e privado. Isto gerou em 1996, requerimento de 442 mil e concessão de 339 mil benefícios, quase 80%. Em 1998, a concessão passou pelos peritos da Previdência e de cada 100 benefícios requeridos apenas 32% foram concedidos. Seja, de 469 mil requeridos foram concedidos 138 mil e rejeitados 330 mil!

Em 2006, foram requeridos 7,0 milhões de benefícios, dos quais 2,8 milhões por incapacidade e concedidos 2,6 milhões. Em 2010, requeridos 7,8 milhões 4,4 milhões por incapacidade e 2,4 milhões concedidos. Em 2013, requeridos 8,6 milhões, 4,7 milhões por incapacidade e concedidos 3,0 milhões.

Assinale-se que no período de 2003 a 2010, houve crescimento da massa salarial, da população economicamente ativa, do nível de emprego e dos segurados contribuintes do INSS.

Em 2014, foram concedidos 4,7 milhões de benefícios por incapacidade isto correspondeu a 58% do volume das concessões e de 59% do total da despesa com benefícios.

Se compararmos os dados de auxilio doença vejam o que aconteceu em 2014 e 2015. Em 2014, foram concedidos 2,3 milhões de auxílios no valor de R$ 2,5 bilhões. E 2015, foram 1.8 milhão no valor de R$ 2,2 bilhões. Neste caso, é evidente que a greve dos peritos foi mais efetiva do que as tentativas de mudança da legislação, proposta pela área econômica do governo.

É verdade que o quadro de peritos não acompanha o crescimento da demanda de auxílios e aposentadorias por incapacidade. Dos 4.500 peritos do quadro, cerca de 3.200 estão na ponta tomando chuva e bordoada e 1.300 estão na retaguarda. O mais grave, é que não há um só perito em áreas críticas do custeio, como na Procuradoria e nas Juntas e Conselhos de Recursos da Previdência Social. Mais ainda, em que pesem as justas solicitações da Associação Nacional dos Médicos Peritos-ANMP as condições de trabalho as nas agências do INSS, que tem perícia (pois não está presente nas pequenas cidades) são críticas e inaceitáveis especialmente nas metrópoles com grande número de segurados (trabalhadores) contribuintes.

A nova tentativa do governo, como reação à greve dos 120 dias dos peritos, por mudança da jornada, salários e condições de trabalho, soa como uma vingança que vai gerar mais ônus para Previdência. A terceirização reimplantada (e que foi nefasta no passado) e a tentativa de levar para os médicos do SUS e para os falsos médicos cubanos a concessão da perícia (revogando a Lei que tornou privativa ao perito médico a realização da perícia) não é só um retrocesso no marco legal. Desarruma Perícia Médica do INSS e instaura um processo de caos. Quem viver verá. Francamente não é uma solução, é um agravo!

(*) Paulo César Regis de Souza vice-presidente Executivo da Associação Nacional dos Servidores da Previdência e da Seguridade Social -ANASPS.

 

 

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