A Previdência não se beneficiou do “bom” de desenvolvimento do país.

Por Paulo Cesar Regis de Souza (*)

Todos os analistas, especialistas e fiscalistas, a serviço do governo e do mercado, querem nos fazer acreditar que, ou se aprova uma reforma previdenciária, ou a Previdência quebra!  Usam números e dados falsos para impor uma reforma que não vai mudar nada, de efetivo, na Previdência, salvo mais restrições nas garantias constitucionais e nos direitos sociais.

O regime de repartição simples e do pacto de gerações não se esgotaram.

A crise da Previdência do Regime Geral de Previdência Social-RGPS tem nome, CGC, CEP: o monstruoso custo dos rurais, as renuncias, as desonerações, os refis, a sonegação, elisão, evasão, brechas legais, não fiscalização, não cobrança da dívida administrativa e ativa e não recuperação de crédito.

A crise da Previdência Complementar tem igualmente nome, CGC e CEP: os políticos dos partidos que arrebentaram os fundos de pensão.

A crise da Previdência dos Regimes Próprios-RPPS tem também nome, CGC e CEP: União, Estados e Municípios não recolhem a contribuição patronal e dos empregados; os que contribuem para o INSS limitam-se a reparcelar o que já foi reparcelado e não pagar em 30 anos; os que tem fundos de pensão arrombaram os mesmos. Há o agravo de que os governos não pagam a contribuição patronal dos militares mas usam a despesa para dimensionar um rombo hipotético, já que não tem receita.

Tem técnicos que ousam desqualificar quem defende que não existirá reforma da Previdência caso não se mexa no financiamento do RGPS ou não se resolva o financiamento dos Regimes Próprios da União, dos Estados e dos Municípios e dos militares federais, estaduais e municipais. Ignora que só o pagamento dos rurais custa R$ 100 bilhões, e que contribuem com menos de 3% ou FR$ 3,0 bilhões. Rotulam de petistas, comunistas, simpatizantes etc. quem não aceita os sucessivos anteprojetos e projetos de reforma anunciados.

O que sempre defendemos foi a fixação da idade mínima, com regras de transição, beneficiando os que estiverem entrando no Regime Geral de Previdência Social.

A bolha demográfica é uma ameaça de longo prazo como são os demais “funrurais “ criados pelos governos, em nome da utilização dos recursos da Previdência Social como instrumentos de política fiscal ou em nome da inclusão previdenciária.

Chamo de “funrural” a renúncia da contribuição patronal das filantrópicas e dos exportadores rurais, do Supersimples, dos Microempreendedores Individuais –MEIs, dos segurados especiais (donas de casas, empegados domésticos e autônomos), com “tratamento diferenciado, simplificado, favorecido ou subsidiado”.

Por ser previdenciário e há 23 anos dirigindo uma entidade de servidores da Previdência, assinalo que nos últimos anos, de 1988, pós Constituição, tivemos pelo menos três reformas constitucionais da Previdência e vários ajustes infra-constitucionais, por leis complementares e ordinárias e decretos. Todas tiveram como objetivo central reduzir o déficit previdenciário, acabar com os privilégios, combater fraudes, corrigir irregularidades…

Tomando por base os dados de 1999-2002, no 2º mandato de FHC, lembro que neste período, a receita previdenciária foi de R$ 238,3 bilhões, (indo o PIB de 4,8% em 1999 a 5,7% em 2003), o déficit foi de R$ 37,8 bilhões, foram concedidos 11,9 milhões de benefícios e chegou-se a 2002 com 21,1 milhões de benefícios em manutenção.

Nos governos de Lula Dilma, de 2003 a 2015, a receita previdenciária foi de R$ 2,1 trilhões (no PIB, 5,19% em 2003, 5,41% em 2007, 5,90% em 2011 e 5,93% em 2015, o déficit bateu R$ 573,6 bilhões (passando de R$ 23,4 bilhões em 2003, R$ 44,8 bilhões em 2007, R$ 35,5 bilhões em 2001 e R$ 85,8 bilhões em 2015), foram concedidos 57,7 milhões de benefícios e fechou-se o ciclo com 32,7 milhões de benefícios em manutenção.

O importante é sabermos que a receita teve forte expansão nas épocas de “vacas gordas”, com crescimento do PIB, da massa salarial, do emprego, da renda, do desenvolvimento econômico e social, que incorporou milhões à nova classe média e tirou milhões da pobreza absoluta.

Mas é igualmente importante reconhecermos que, no âmbito da Previdência, a crise foi se agravando, com o crescimento do déficit e redução do valor médio do benefício (na concessão e na manutenção) uma vez que também cresceram os números de beneficiários (aposentados e pensionistas), bem como benefícios de prestação única ou de prestações descontinuadas).

Os beneficiários que recebiam benefícios acima do salário mínimo, mal tiveram a reposição da inflação e muitos foram buscar por via judicial melhorias nos seus ganhos, já que desejavam receber o mesmo valor que lhes coube no momento na concessão do benefício.

Mais o destrambelhamento da Previdência Social ocorreu justamente na década do “boom” brasileiro, pois junto vieram a sonegação, acentuada a partir de 2007, quando a Receita Previdenciária foi incorporada pela Receita Federal, os REFIS anuais, que beneficiaram os caloteiros, públicos e privados, com redução dos encargos e ampliação dos prazos para não pagar as dívidas, o aumento das renuncias e das desonerações contributivas, a partir de 2011, a utilização dos recursos da Previdência Social na Desvinculação de Receitas da União-DRU e a não cobrança da dívida administrativa e ativa da Previdência Social.

Imaginar que a reforma da Previdência proposta – sem mexer no financiamento –  vai reduzir o déficit, é como imaginar que o Brasil vai mandar uma nave espacial a Marte em dois anos.

Não há hipótese fiscal, econômica, financeira, matemática, física, disto ocorrer.

(*) Paulo César Régis de Souza é vice-presidente da Associação Nacional dos Servidores da Previdência da Seguridade Social-Anasps.

 

Previdência Social